Mais uma vez estou aqui para narrar uma das muitas histórias do Pari.
Continuamos mostrando o livro do Laudo Paroni “Pari memórias “.
Hoje o Laudo os fala dos finais de semana no Pari, nos anos 50 e 60.
Praticamente não se precisava sair do bairro para nada, tínhamos futebol,
cinemas, bailinhos, “footing “no Larguinho.
Bate-papo, muito bate-papo, pebolim.
Diversões para todos os gostos.
Bem, vamos a mais um capítulo do livro do Laudo aroni:
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SÁBADOS E DOMINGOS, UMA FESTA
O pessoal dava duro a semana toda, principalmente em um bairro como o Pari, onde predominavam gente da classe média e operários. Mas, quando chegava o fim de semana, a rotina mudava completamente. O sábado, por exemplo, começava com as compras na feira, até hoje instalada no mesmo local – Praça Eduardo Rudge ( o popular Largo da Feira ) e Rua Mendes Gonçalves, até a esquina com a Rua Silva Telles. O movimento, assombroso logo às primeiras horas, engrossava bastante entre 11h30 e 12h30, quando os preços das verduras, frutas e legumes costumavam cair. O local, tomado pela multidão, ficava intransitável. Logo no início da feira, na praça, ficavam as barracas de flores; em seguida vinham as de frios, azeitonas, azeites e laticínios; depois as de peixe, carnes, legumes, verduras, frutas nacionais e importadas, cereais, roupas, produtos de limpeza e utilidades domésticas – entre elas vassouras, rodos, esfregões de assoalhos, esponjas de aço para arear as panelas e outras tantas. O arroz, acondicionado em sacas de 60 quilos, era pesado na hora, à vista do comprador. O de melhor qualidade – e também o mais caro – era o amarelão extra; em segundo, o amarelão. O mais popular e barato era o cateto. Entre os feijões, havia o roxinho, o mulatinho, o preto e o jalo.
Os feirantes, em sua maioria de origem italiana e portuguesa, conheciam a clientela, estabelecendo com ela uma relação de confiança e amizade. Havia também os japoneses, uns com barraca de pastel, outros com as de verdura. Um senhor de cabelos e grosso bigode grisalhos, percorria a feira de ponta a ponta oferecendo a focaccia feita em casa, conservada quente dentro de uma espécie de tambor de metal. O isopor ainda não existia.Quase todos os feirantes tinham os seus pregões, que usavam para chamar a atenção: “Moça bonita aqui não paga… mas também não leva!”; ou “coisa boa a gente vê de longe!”, de duplo sentido, referindo-se ao mesmo tempo à mercadoria que vendiam e às mulheres bonitas que passavam. “Fresco aqui só o peixe… Aproveita, dona!”. Para ganhar algum dinheiro e garantir a matinê de domingo à tarde no Savoy, Rialto, Haiti, Oberdan, Glória, Brás Politeama, Roxy e Universo, os cinemas mais concorridos da época, a garotada postava-se na ponta das feiras, oferecendo serviços de carreto. E, de centavo em centavo, ajuntavam o dinheiro do ingresso. A matinê de domingo, com os seriados do Zorro, Super-Homem, Fantasma, Flash Gordon e os filmes de faroeste estava garantida. A feira, barulhenta, misturava o vozerio de vários sotaques aos pregões dos feirantes. Sem sofrer a concorrência dos supermercados, que só surgiriam anos depois, os feirantes eram mais alegres e brincalhões, transformando a feira em um show, que se renovava todos os sábados.
Depois da feira, chegava a sacrossanta hora do aperitivo, que lotava bares, botecos e vendinhas. Todos matavam o bicho, como se dizia na época , enquanto a mulher preparava o almoço. Era o momento de colocar o papo em dia, de combinar os programas para o domingo, com a família, a namorada ou os amigos. Depois das 3 da tarde, era a vez da vaidade: os homens iam cortar cabelo e fazer a barba ( no capricho, com direito a toalhinha quente e muita espuma ). No salão do Ângelo Tessari, os mais abastados tinham a sua Acqua Velva – loção pós-barba – personalizada. Cada frasco estampava o nome do seu usuário, feito em carimbo “inventado” pelo Toninho Mosquito. Um luxo! Os cabelos também mereciam um atenção especial. Para assentar os fios mais rebeldes, usava-se Gumex, pai do laquê e avô do gel. Era um pozinho que se misturava à água e, quando secava, fixava como cola. A propaganda do produto, via rádio, era conhecida de todos: Dura lex, sed lex; no seu cabelo, só Gumex. A locução latina – “ a lei é dura, mas é lei” – foi usada apenas para rimar com o nome do produto. Coisas da propaganda… Glostora, Óleo de Lavanda Bourbon e as brilhantinas Royal Briar, Gessy e Atkinsons assentavam e davam brilho às cabeleiras. Royal Briar, o perfume que deixa saudade! garantia o comercial do produto. Para combater a caspa havia o Quina Petróleo Sandar. Juventude Alexandre, Loção Pindorama e Loção Brilhante escondiam os fios brancos, prometendo “ devolver aos seus cabelos a cor natural…”
As barbearias lotavam aos sábados e os retardatários imploravam para serem atendidos. Com isso, o trabalho, muitas vezes, estendia-se além das 20 horas, mas não afetava o humor do Ângelo, Paulino, Valdomiro, Júlio, Pixoxó, Nivaldo, Zezinho, Mineiro, Valdir, Isaías e outros cirurgiões capilares que, em diferentes épocas, cuidaram com carinho das cabeças do bairro.
As mulheres também não deixavam por menos e passavam boa parte da tarde do sábado nos salões de beleza da Mariazinha, Suzette, Célia, Hermínia, Meme e do badalado Henrique, na Avenida Vautier, considerado o mais chique do pedaço, além de outros. No início dos anos 50, surgiu o Mulsified, o primeiro xampu perfumado, respaldado por intensa propaganda, cujo jingle as rádios não paravam de tocar: Mulsified xampu perfumado/ deixa os cabelos sedosos/ pra melhor penteado/ Mulsified xampu perfumado!” Geralmente, porém, os cabelos eram lavados com sabonete – Lux e Palmolive eram os mais usados. Além de colocar as fofocas em dia, as mulheres deixavam os salões completamente renovadas e cheias de glamour, por conta da maquiagem à base de de pó-de-arroz, rouge ou pancake no rosto, rímel nos cílios e sombra nos olhos – para alegria dos homens.
O programa de sábado à noite era variado e incluía cinema, baile, festinhas de aniversário e de casamento, quermesses e o footing sempre concorrido da Avenida Celso Garcia e do Larguinho Santo Antônio. Depois da paquera, dependendo da hora, dava-se uma passada pelo bar para bater papo e comer bauru, churrasco, misto quente ou americano. Muitas famílias aproveitavam o sábado para saborear, em casa, as pizzas assadas no forno de lenha, que mandavam buscar no Mário Lamana, na Padaria Brasil ( dos irmãos Vicente, Mingo e Ângelo Tempone), na Balneária, na Flor de Liz e no Gato Preto. Ou, então, iam ao Restaurante Santos, ao Jardim Toscano, ao São Paulo Moderno, ao La Bambolina ( na Rua João Teodoro, encostado ao Cine Rialto) , ao Restaurante Rialto ou ao Bar Azul. Opções não faltavam, principalmente para as famílias mais abastadas. Domingo era um dia recheado de programas, em que o macarrão da mamma, com molho de tomate feito em casa, cozido e esmagado na peneira – um orgulho para os descendentes de italianos – tinha presença assegurada. Os demais itens da programação dominical incluíam desde pescarias ( na represa Billings ou, então, na lagoa do Canindé, ali mesmo, no bairro) , torneio de baralho e dominó, jogos de futebol ( profissional e varzeano ) até cinemas e teatro. No Colombo, que ficava no Largo da Concórdia e foi destruído por um incêndio em 1966, o comediante Nino Nello apresentou durante muitos anos o seu espetáculo, com sessões sempre concorridas. Quem tinha televisão – e eram poucos – via o Circo do Arrelia pela TV Record, antes do futebol, com jogos transmitidos ao vivo do Pacaembu sempre lotado. Quem não tinha TV, dava um jeito de ser convidado para ver o jogo. Eram os televizinhos. Mediante o consumo de uma cerveja, alguns bares permitiam que os fregueses vissem o jogo. Era o caso do Gato Preto, do Jorge Português ( Rio Bonito com Conselheiro Dantas ) e do Bar da Televisão, na Paganini com Itaqui.
Para os mais jovens , vemos na foto , um sonho de consumo de muita gente nos anos 50,
uma rádio vitrola . Na parte inferior do móvel, lugar para guardar os discos.
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